segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Culturama: O padre maldito

Expulso da cidade pelos coronéis, primeiro vigário de Rio Verde rogou pragas que perseguiram seus inimigos até o túmulo.
Designado para tomar conta dos interesses da Igreja na Freguesia de Nossa Senhora das Dores do Rio Verde, em 1887, o padre Mariano Ignácio de Souza não foi recebido com festa pelos coronéis da época. Em um tempo em que os limites das fazendas eram marcados com sangue, ele comprou briga com os poderosos ao defender as propriedades da igreja e praticar um estilo de vida pouco convencional.
Vivendo ao mesmo tempo com duas mulheres que volta e meia se atracavam em público, logo teve de explicar sua situação para as autoridades eclesiásticas. O puxão de orelha resultou no licenciamento para que regesse a Paróquia de São Domingos do Araxá, em Minas. Segundo o livro Goiás*, era comum no sertão que um padre vivesse com uma mulher. A poligamia já era por conta do Padre Mariano. Conforme registrado no livro Rio Verde Histórico*, as mulheres do vigário eram “Sá” Joaquina e Ignês Pauliciana Ribeiro, ambas notórias por serem “extraordinariamente gordas e altas.”
 No dia em que partia para o “gancho” em Minas – uma jornada que duraria mais de 30 dias de estrada – um rico coronel chamado Souza preparou uma despedida cruel e sarcástica. Encomendou a seis de seus capangas uma salva de fogos e todo o tipo de afronta moral na porta de residência do pároco. Somente depois da insistência de um bondoso fazendeiro, o coronel encerrou a baixaria. Abatido e chorando sobre o dorso de um cavalo, antes da partida Padre Mariano rogou uma praga tremenda ao mandão: Souza morreria “varado de balas da cabeça aos pés.” Tempos mais tarde, depois de uma desavença na freguesia, o destino confirmou a maldição do padre. 
Depois de quase um ano afastado, Padre Mariano retornou a Rio Verde por força de uma Carta Imperial, que o distinguia como vigário colado. Foi recebido com o mesmo ódio dos coronéis, mas abraçado pelo povo mais simples. Formalista, mas dono de rompantes de nervosismo, escreveu uma carta de desabafo ao Bispo Dom Eduardo sobre a sua experiência. “Estou cansado do sertão, desanimado das lutas estéreis, onde não se tem menor garantia, nem espiritual, nem pessoal, nem social (...) Lugar disciplinado só para assassinos e valentões bafejados pela perfídia dos velhos capitães mores e sub-régulos responsáveis perante Deus pelas muitíssimas mortes de que foram autores e causadores. Pobre Freguesia, qual uma esposa adúltera rejeitada por todos os vigários que infelizmente ali vão esposá-la na boa fé da Freguesia rendosa (...), obstruindo os caminhos do Senhor!”
Padre Mariano foi sepultado no dia 23 de março de 1917 na Igreja São Sebastião, a primeira da cidade e cuja ordem de construção tinha sido dada por ele 10 anos antes de morrer. Em sua lápide está escrita a seguinte mensagem: “Nesta cova está apenas o seu corpo alquebrado pelos annos e pelos desenganos. A sua alma, esta está no coração das crianças pobres que ele amou.” (F.M.)

Fontes:
Rio Verde Histórico. Autor: Onaldo Campos
Goiás. Autor: Victor Coelho de Almeida.


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