Carlos Willian Leite
@revistabula – E-mail: carloswillian@uol.com.br
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Pelo Twitter e Facebook perguntei a 35 convidados, de díspares perfis e tendências, quais eram os melhores inícios de livros que haviam lido. Cada participante poderia indicar até três começos inesquecíveis, de autores brasileiros ou estrangeiros de todas as épocas. A partir da lista dos convidados, elaborei minha lista pessoal. Discutível como todas as listas de melhores, esta também não pretende ser abrangente. E os livros citados aqui, bons ou ruins, trazem em comum o fato de ter me inspirado.
O Apanhador no Campo de
Centeio
(J.D. Salinger)
(J.D. Salinger)
“Se querem mesmo
ouvir o que aconteceu, a primeira coisa que vão querer saber é onde nasci, como
passei a porcaria da minha infância, o que os meus pais faziam antes que eu
nascesse, e toda essa lenga-lenga tipo David Copperfield, mas, para dizer a
verdade, não estou com vontade de falar sobre isso. Em primeiro lugar, esse
negócio me chateia e, além disso, meus pais teriam um troço se contasse
qualquer coisa íntima sobre eles.
O Ventre
(Carlos Heitor Cony)
(Carlos Heitor Cony)
“Positivamente,
meu irmão foi acima de tudo um torturado. Sua tortura seria interessante se eu
a explorasse com critério — mas jamais me preocupei com problemas do espírito.
Belo para mim é um bife com batatas fritas ou um par de coxas macias. Só creio
naquilo que possa ser atingido pelo meu cuspe. O resto é cristianismo e pobreza
de espírito.”
A Metamorfose
(Franz Kafka)
(Franz Kafka)
“Quando certa
manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranquilos, em sua cama metamorfoseado
num inseto monstruoso. Estava deitado sobre suas costas duras como couraça e,
ao levantar um pouco a cabeça, viu seu ventre abaulado, marrom, dividido por
nervuras arqueadas, no topo de qual a coberta, prestes a deslizar de vez, ainda
mal se sustinha.
O Amanuense Belmiro
(Cyro dos Anjos)
(Cyro dos Anjos)
“Ali pelo oitavo
chope, chegamos à conclusão de que todos os problemas eram insolúveis.
Florêncio propôs, então, um nono, argumentando que outro copo talvez trouxesse
a solução geral. Éramos quatro ou cinco, em torno de pequena mesa de ferro, no
bar do Parque. Alegre véspera de Natal! As mulatas iam e vinham, com requebros,
sorrindo dengosamente para os soldados do Regimento de Cavalaria.
O
Jardim do Diabo
(Luis Fernando Verissimo)
(Luis Fernando Verissimo)
Me chame de Ismael e eu não atenderei. Meu nome
é Estevão, ou coisa parecida. Como todos os homens, sou oitenta por cento água
salgada, mas já desisti de puxar destas profundezas qualquer grande besta
simbólica. Como a própria baleia, vivo de pequenos peixes da superfície, que
pouco significam mas alimentam.
A
Lua Vem da Ásia
(Campos de Carvalho)
(Campos de Carvalho)
Aos 16 anos matei meu professor de lógica.
Invocando a legítima defesa – e qual defesa seria mais legítima? – logrei ser
absolvido por cinco votos a dois, e fui morar sob uma ponte do Sena, embora
nunca tenha estado em
Paris. Deixei crescer a barba em pensamento, comprei um par
de óculos para míope, e passava as noites espiando o céu estrelado, um cigarro
entre os dedos.
Dom
Casmurro
(Machado de Assis)
(Machado de Assis)
Uma noite destas, vindo da cidade para o Engenho
Novo, encontrei no trem da Central um rapaz aqui do bairro, que eu conheço de
vista e de chapéu. Cumprimentou-me, sentou-se ao pé de mim, falou da Lua e
dos ministros, e acabou recitando-me versos. A viagem era curta, e os
versos pode ser que não fossem inteiramente maus.
Notas do Subsolo
(Fiódor Dostoiévski)
(Fiódor Dostoiévski)
“Sou um homem
doente... Sou mau. Não tenho atrativos. Acho que sofro do fígado. Aliás, não
entendo bulhufas da minha doença e não sei com certeza o que é que me dói. Não
me trato, nunca me tratei, embora respeite os médicos e a medicina. Além de
tudo, sou supersticioso ao extremo; bem, o bastante para respeitar a medicina.
Anna Kariênina
(Liev Tolstói)
(Liev Tolstói)
“Todas as famílias
felizes se parecem, cada família infeliz é infeliz à sua maneira. Tudo era
confusão na casa dos Oblónski. A esposa ficara sabendo que o marido mantinha um
caso com a ex-governanta francesa e lhe comunicara que não podia viver com ele
sob o mesmo teto. Essa situação já durava três dias e era um tormento para os
cônjuges, para todos os familiares e para os criados.
Moby Dick
(Herman Melville)
(Herman Melville)
“Chamem-me
simplesmente Ismael. Aqui há uns
anos não me peçam para ser mais preciso —, tendo-me dado conta de que o meu
porta-moedas estava quase vazio, decidi voltar a navegar, ou seja, aventurar-me
de novo pelas vastas planícies líquidas do Mundo. Achei que nada haveria de
melhor para desopilar, quer dizer, para vencer a tristeza e regularizar a
circulação sanguínea.
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