segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Especial: O talentoso João Ford


Inventor, aviador, engenheiro, boêmio e dono de temperamento imprevisível, paulista sacudiu a vida da cidade no século passado com suas proezas.


Voltando de uma pescaria em 1918, as rodas do Ford novinho em folha pilotado por João do Carmo Nascimento ficaram inutilizadas depois de bater num barranco em uma estrada de terra perto de Uberaba. Sem muita alternativa, João pegou um machado e se embrenhou no mato em busca de uma forquilha bem resistente. O problema era a falta de uma sustentação para que o eixo dianteiro ficasse no lugar certo. Ele encaixou as duas pontas do objeto em forma de “V” nas extremidades do eixo e fixou o pé num suporte pouco atrás do motor, prendeu com um pedaço de arame farpado retirado de uma cerca e pronto. O veículo estava em condições de seguir viagem*. 
O que João não imaginava era que a peça seria fotografada por concessionários da Ford em Uberaba e enviada para a fábrica em São Paulo, que logo tratou de informar a novidade para a matriz nos Estados Unidos. Pouco tempo depois, o inventor receberia uma carta escrita de próprio punho por ninguém menos do que Henry Ford. O dono da Ford Motor Company, conhecido mundialmente por revolucionar a fabricação de veículos com a criação das linhas de montagem, o congratulava pela invenção e informava que a peça já estava sendo utilizada na nova linha de carros Ford. João não pediu dinheiro, mas apenas o direito de adotar Ford como sobrenome. A partir de então, deixava de ser João do Carmo Nascimento para se tornar o lendário João Ford. O industrial norte-americano, que era um dos homens mais ricos do planeta, ainda enviaria de presente um relógio de ouro e um Ford modelo T, o mais cobiçado da época.

Inovador
Nascido em Ituverava (SP) em 1890, João ainda não tinha 12 anos quando começou a trabalhar como varredor de oficinas da Ford em São Paulo. Aos 29 anos, mudou-se para Rio Verde, onde abriu uma distribuidora da marca de carros que viraria seu sobrenome. Sempre à frente do seu tempo, chacoalhou a vida social do município com suas ideias e ações inovadoras para a cidadezinha do início do século passado que tinha pouco mais de 2 mil habitantes.
Além de dar manutenção na maioria dos veículos da cidade em sua revendedora e oficina, João Ford era apaixonado por aviões e cruzava os céus da cidade em modelos como Porterfiled e o clássico Piper Club, hoje um xodó dos colecionadores. Nos primórdios da aviação comercial do Brasil, encampou a fundação do Aeroclube de Rio Verde. Membro do Aero Clube do Brasil, obteve inclusive diploma de aviador internacional em 1941.
Sempre ávido por conhecimento, fez um curso por correspondência da norte-americana National Association of Correspondence School e conquistou os direitos profissionais de engenheiro. Construiu casas, pontes e abriu estradas, tendo sido um dos principais responsáveis pela instalação da rede de distribuição de água de Rio Verde. João Ford foi também um dos fundadores da primeira rádio difusora local. 
Irreverência
João Ford era casado com Itelva Massi Ford, uma filha de italianos que conquistou o coração do inventor com um belo par de olhos azuis. O local onde funcionava a oficina de João se transformou no Hotel Ford, hoje já desativado. Dona Itelva faleceu no ano passado aos 105 anos de idade. Filha única do casal, Dona Aparecida mora até hoje no mesmo local. As paredes e os móveis guardam fotografias e lembranças do pai, como documentos antigos e uma hélice de madeira do velho Piper Club.
Ela conta que o pai era um boêmio inveterado e não dava valor ao dinheiro. “Ele gostava mesmo era de beber com os amigos”, revela. João Ford era o melhor chaveiro da cidade e realizava serviços para empresas, órgãos públicos e particulares. “Quando os clientes perguntavam quanto tinha ficado o trabalho, costumava responder: ‘Deixa uma caixa de cerveja paga lá no bar que está ótimo’”, relembra com saudade. 
Certa vez, um gerente de um banco cometeu a gafe de trancar o cofre com as chaves do lado de dentro. A matriz explicou que demoraria vários dias para poder enviar um profissional para resolver o problema. A saída foi chamar João Ford, que foi encontrado bebendo com os amigos em um bar no centro da cidade conhecido como “boca maldita.” Em poucos minutos, o chaveiro experiente abrira com facilidade o cofre. Na hora do acerto é que ocorreu o problema. O gerente achou o preço muito “salgado.” Sem titubear, João Ford trancou a porta, jogou de volta a chave por debaixo da porta e voltou para a companhia dos amigos, deixando o funcionário do banco desconcertado. 

*Fonte: Rio Verde, Apontamentos para a sua história. Oscar Cunha Neto.

2 comentários:

  1. ele é parente meu, itelva massi era irmã da minha bisavo maria massi

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    1. esses dias atrás a minha avó me conto a historia e eu estava procurando mas nunca achei ate agora, obrigado por escrever sobre ele.

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